quarta-feira, 11 de julho de 2012


Não é todos os dias que nos referimos com carinho a quem faz parte da mobília. Não só não nos referimos a esses com carinho, como não nos lembramos de falar sobre eles. Estamos habituados a esticar um dedo e tê-los lá, a passar todo o tempo do mundo a seu lado.
Pois assim foi. Achei que deveria dedicar um pouco do meu tempo a um desses bichanos que me têm acompanhado ao longo de todos os dias, até mesmo aqueles que parecem não ter fim.
Tudo começa com o acordar. Não o seu acordar, mas o meu. Oiço um zumbido que na realidade não é mais que o seu miar. Levanto-me, dirijo-me à janela para a abrir. Primeiro a persiana, depois o vidro. Vá, anda, digo baixinho. Ele salta do tejadilho para o parapeito da minha janela e entra pelo meu quarto dentro.
Numa dezena de passos, vou da casa de banho azul à branca. Ele segue-me, como quem sabe o caminho de cor e salteado. Vai-se roçando delicadamente nas minhas pernas, como sempre faz. Ou isso ou os beijinhos que me dá no nariz, quando não resolve lamber-me as mãos, com a sua língua áspera mas dócil.
Miau.
Chegámos, eu sei. Ainda antes de abrir a torneira, já ele estava preparado para beber água, como que impaciente. Abri um pouco a torneira do bidé, de modo a não lhe molhar as suas patas dianteiras. Cerca de cinco minutos que esteve a beber água. Gota a gota. Mil gotas, mil vezes ele mexe a língua.
É extraordinário a forma como tu, ó gato, desperdiças cinco minutos do teu tempo, quando não são dez, a beber água.
E de facto nós consumistas não o fazemos, porquê? Nós que transbordamos sede infinita de tudo e que tanto gostamos de satisfazer imediatamente as nossas necessidades, perdemos cinco minutos ou mesmo dez a beber água, se não estivermos sentados num café a fazer tempo?
Não tenho resposta para a pergunta que aqui coloco. Certamente, este meu Baltasar (é esse o nome dele) mostra-nos como são importantes as necessidades básicas do ser vivo. Todos adorávamos ser animais, para não fazer nada. Mas fazemos nós algo de útil para com o mundo? Preservamos nós os nossos animais, a natureza? Combatemos para que haja sempre água e para que tenhamos sempre forma de satisfazer a nossa sede?
Assim o faz este gato. Para muitos é um simples animal, um bicho, para outros, mas para mim não é tao fácil defini-lo quanto parece. Vale mais que muitas pessoas, vale sim.
Este, ao qual dediquei uns minutos da minha vida, é o Baltasar, o meu Baltasar.
Parte da minha mobília. Uma das minhas preciosidades.

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